sexta-feira, 8 de fevereiro de 2013

1-4-2-3-1: da Solução Estrutural à Solução de Fato



Partindo dos problemas estruturais a serem resolvidos no jogo, esse esquema tático vem sendo muito utilizado pelos treinadores atualmente

“Tão importante quanto visualizá-la de maneira estática é o
treinador compreender toda a dinâmica relacional da plataforma”
(Zago in Arruda et al, 2013, p. 441)

O esquema tático (ou plataforma tática) 1-4-2-3-1 vem sendo muito utilizado por todo o futebol mundial, inclusive no Brasil. Assim como aconteceu com o 1-4-4-2, depois com o 1-3-5-2, o 1-4-2-3-1 passou a ser visto como a solução de todos os problemas. Entender porque um esquema tático se torna mais “popular” entre os treinadores talvez seja tão ou mais fundamental do que entender o próprio esquema. Em geral, esse esquema se apresenta das seguintes formas apresentadas abaixo.

Figura 1 – Variações estruturais básicas do 1-4-2-3-1
Figura 1 – Variações estruturais básicas do 1-4-2-3-1
Basicamente, o 1-4-2-3-1 se apresenta nas três formas apresentadas acima ao longo do jogo e, dependendo das características dos jogadores e da proposta de jogo com mais regularidade em uma delas, porém passando ocasionalmente pelas outras duas. Na estruturação original, o primeiro campo corresponde ao esquema montado com dois volantes e três meias. No campo central, os alas devem possuir características para tal função. E no campo da direita, as características dos jogadores das laterais da linha de meias (?!) normalmente são atacantes que não de referência.




Figura 2 – Hierarquia das Interações entre os meias e atacantes
Ao longo do jogo, dependendo da posição da bola e da equipe que detém a posse, o esquema tático vai se deformando para se ajustar às necessidades momentâneas (recuperação da bola, direcionamento do jogo do adversário, construção do jogo, fase de finalização, etc.). O 4-2-3-1 geralmente passa pelos arranjos apresentados (figura 1) durante o jogo pela proximidade dessas posições com a que seus jogadores ocupam em campo mais naturalmente. Porém, em muitos casos, apesar de considerar que esse esquema tático é a base para as outras variações, o que vai definir realmente o esquema tático é a forma como os jogadores interagem em campo. Na figura 2, as setas laranjas indicam uma “relação mais forte” entre os jogadores do setor, enquanto as setas pretas indicam uma “relação menos forte” entre seus membros. Portanto, independentemente de como o esquema é nomeado, o que vai defini-lo é o resultado dessas interações. Nas três situações (figura 2) os meias / alas / atacantes podem ser assim chamados de acordo com os parceiros com quem interajam mais fortemente. No primeiro campo (figura 2), a linha com três meias realiza suas dinâmicas baseado primeiramente nos comportamentos de seus companheiros dessa linha. A linha possui dinâmicas que então conectadas com as da equipe. Há uma hierarquia, que respeita e integra essas dinâmicas num todo funcional em direção à eficácia no jogo. No campo central, os alas interagem mais fortemente com a linha de volantes e menos fortemente com o meia central. Como produto, a equipe trabalha mais em uma plataforma 1-4-4-1-1 pela forma como estrutura o espaço na solução dos problemas do jogo. No campo da direita, há uma interação maior com o atacante centralizado do que com o meia do centro. Visualmente, emerge o 1-4-3(2-1)-3. A relação não acontece apenas no nível espacial, portanto, mesmo que a equipe transite entre os três desenhos, será atraída para uma configuração em especial.


Figura 3 – Duas possibilidades para a Pressão Alta (Linha 1)
Acima são apresentadas duas possibilidades de estruturação espacial para a pressão na referida plataforma tática. No primeiro modelo, a “linha de 4” defensiva fica preservada e os volantes flutuam de maneira mais agressiva para o lado da bola compensando a manutenção do lateral na linha. Como vantagem, a linha defensiva fica mais larga, porém uma zona frágil tem que ser administrada no centro (oposto à bola) conforme destacado na figura 3 (retângulo horizontal vermelho). Com a subida do lateral fechando a paralela, o centro do campo fica mais povoado (modelo à direita na figura 3), porém a linha defensiva fica mais estreita, com maior fragilidade às diagonais longas (zona vermelha – retângulo vertical). Obviamente, a abordagem do jogador que pressiona a bola muda em função do tipo de pressão (direcionando para o centro ou para a paralela).



Figura 4 – Posicionamento para Pressão a partir da Linha 2

Do ponto de vista estrutural, a pressão a partir da linha 2 (intermediária de ataque) é melhor acomodada pela plataforma do que a pressão alta (linha 1). Os espaços entre os laterais e os meias do mesmo lado (LD – MD e LE – ME), são mais facilmente diminuídos e a necessidade de ajustes é menor, conforme demonstrado na figura 3. Habitualmente, a pressão inicia quando a bola é direcionada para uma das laterais, conforme o campo da direita da figura 4. Dependendo do princípio operacional (recuperação da bola ou impedir a progressão) o atacante se comporta de maneira diferente. Para a recuperação, ele busca manter a bola na zona para poder ser pressionada (tirando linha de passe no zagueiro ou que permita a virada). Se o objetivo for impedir a progressão, ele pode entrar atrás da linha da bola novamente e permitir a circulação.


Figura 5 – Organização defensiva na Linha 4 e Balanço Ofensivo

Dentre as possibilidades de organização defensiva na linha 4 (intermediária defensiva) que o esquema tático permite, duas estão apresentadas na figura 5. No campo da esquerda, a opção é por uma proporção (Leitão, 2009) mais conservadora do ponto de vista numérico com viés defensivo, enquanto no campo da direita há uma proporção mais ousada. A proporção é um conceito das duas fases de transição (ataque-defesa e defesa-ataque) que, segundo o autor, relativiza o número de jogadores que estão efetivamente “defendendo” ou “atacando” sem que isso possa parecer uma fragmentação, apenas como sistematização do conteúdo. No campo à esquerda a proporção é de (2 x [8 + G]), ou seja, dois jogadores com preocupações já ofensivas no caso da recuperação da bola e nove (goleiro incluso) jogadores envolvidos mais diretamente com a sua recuperação. No campo da direita a proporção é de (4 x [6 + G]). Naturalmente, a ocupação do espaço pelos jogadores permite um balanço ofensivo (em destaque no campo à direita) que rapidamente pode deixar o ataque com boa amplitude (MD e ME) e profundidade (AT). Em compensação, com esse balanço, a marcação em largura (equilíbrio horizontal) fica prejudicada. O posicionamento do campo à esquerda oferece um melhor equilíbrio defensivo (em largura inclusive), porém, no movimento seguinte à recuperação o tempo para ocupar o campo de ataque é maior.


Figura 6 – Balanço Defensivo
  
Na figura 6 são mostradas duas possibilidades de balanço defensivo com a estrutura e a proporção (6 x [4 + G]) mantidas, mas com variação dos jogadores que o realizam. No campo à esquerda, um volante faz o balanço da jogada (VD) e o outro da equipe (VE). No outro modelo, o lateral faz o balanço da jogada (LD) e o volante do lado da bola (VD) o da equipe, com o outro volante (VE) mais adiantado. O balanço defensivo do campo à esquerda, coloca mais jogadores na lateral em que está a bola (aumentado as chances de triangulações) enquanto o balanço defensivo do campo à direita preenche mais a faixa central. As vantagens e desvantagens devem ser pesadas. Há muitas outras possibilidades, como o lateral oposto no balanço (5 x [5 + G]), por exemplo.
De maneira consciente ou intuitiva, o 4-2-3-1 ganhou espaço no Brasil quando algumas preocupações coletivas começaram a nortear as ações dos treinadores. Em boa parte das situações, o esquema ainda é utilizado por permitir encaixes individuais mais facilmente. Originalmente com três meias, conforme apresentado, no Brasil é mais normal observá-lo com dois atacantes abertos (seria um 1-4-3-3?) e um mais centralizado ou até com um atacante aberto de um lado e um meia no outro, quase um 1-4-4-2 “disfarçado”. O esquema ou plataforma tática não se esgota nele mesmo. Todos os conceitos discutidos podem ser resolvidos em outros esquemas, desde que a essência do problema seja entendida.




Referências Bibliográficas

Arruda, M. et al. Futebol: ciências aplicadas ao jogo e ao treinamento. São Paulo. Phorte, 2013. 560p.

Leitão, R.A.A. Ciências do esporte aplicadas ao futebol: reflexões sobre a organização do jogo. 2008. 101 f. Livro didático de apoio. Curso de especialização em futebol e futsal. Universidade Gama Filho, 2008.



Leandro Zago